MIRADA POR SERGIO BLANCO

OPINIÃO

Por Sergio Blanco

Primeiramente, fico encantado por participar de um Festival chamado Mirada. Porque a palavra coloca as artes cênicas em sua essência, que é mirar. Às vezes, esquecemos que nós somos essencialmente uma arte da mirada.

Vem da palavra ‘teatro’, que quer dizer “teatrón”, “mirador”, “lugar de onde se mira”. E há um textocentrismo burguês no século XIX que impôs ao teatro uma condição literária, que exige mais textos escritos, dando uma importância de literatura ao teatro.

E nós esquecemos que o teatro é uma arte audiovisual. O que está em jogo é a mirada. É uma arte de mirador, onde vamos a mirar pessoas atuando.

Então, fico encantado em participar de um Festival que leva esse nome. Poucos festivais têm um nome tão bonito. É muito bela essa palavra, porque a mirada, a organização da mirada é algo profundamente poético e político. A mirada é um ato, do ponto de vista fisiológico, que reúne a poética. É uma organização de formas, como na política.

É um Festival que, neste sentido, deixa posto que há algo de poético e político. 

O encontro com o outro 

Uma coisa magnífica de festivais é o fato de os artistas poderem se encontrar, as equipes poderem se encontrar. Isso é algo maravilhoso! Não somente ver os espetáculos, mas conhecer o projeto.

Hoje mesmo tomei café da manhã com a Marina Otero, que eu não conhecia. Nossas equipes também se conheceram e fomos à praia e, depois, à piscina do hotel. Isso é algo muito bom, né? Criar redes de trabalho de relacionamento, as pessoas se encontrarem entre elas.

E depois, estar no Sesc também é algo maravilhoso porque é um lugar que é uma ágora, um espaço muito interessante que só existe neste país, no Brasil. É um dispositivo extraordinário, uma experiência que nos proporciona o poético e político. Aqui, mundos distintos se cruzam.

E o Festival Mirada, em particular, se dedica muito a isso. Uma coisa que pode parecer superficial, por exemplo, é que possamos comer todos juntos no refeitório. Isso é algo maravilhoso! Nos permite compartilhar um momento tão íntimo como comer com outras pessoas. Me lembra das escolas, todo mundo com sua bandeja, escolhe o que comer, é muito bonito!

Esses são momentos onde a humanidade vai se criando. E aí está a política.”

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O dramaturgo e diretor teatral Sergio Blanco conversou com a equipe entre as apresentações de “Cuando pases sobre mi tumba”, que teve sua estreia brasileira no Mirada. Desta vez a pauta não foi sobre a sua obra, mas, sim, sobre o que como ele vê o Festival!